𝐣𝐮𝐬𝐭 𝐤𝐞𝐞𝐩 𝐛𝐫𝐞𝐚𝐭𝐡𝐢𝐧.
quando o relógio marcou 23:58 da quinta-feira, haerin ainda estava acordada. sentada na cama, pernas cruzadas, encarando uma página em branco no sketchbook. tinha tentado desenhar alguma coisa, mas o lápis parecia não cooperar com ela.
o aniversário dela estava a dois minutos de distância e ela nem sabia se queria que chegasse. estava cansada, preocupada, com saudade da sushi e com aquela sensação de que tudo tá dando errado. foi aí que ouviu passos apressados no corredor. a porta se abriu e haerin piscou, surpresa, quando viu os amigos enfiados no batente.
haerin arregalou os olhos. queria protestar, dizer que não precisava eles estarem ali, mas a verdade é que ela precisava de um abraço amigo. desesperadamente. e claro, ela não pode evitar de ficar emocionada vendo eles ali logo quando a hora (00:00) acendeu na tela do celular.
e, no meio dos risos abafados, dos cobertores sendo puxados e dos “vem cá, anda”, os olhos da haerin foram ficaram pesados, mas pela primeira vez em dias, pesados de alívio, não de exaustão.
nada estava resolvido. a dívida ainda estava lá. a sushi ainda estava internada. mas naquela madrugada, ela não estava sozinha.
haerin acordou antes de todo mundo, o quarto quente com a respiração dos amigos espalhados em colchões improvisados. teve que passar por cima de uma perna e dois cobertores para alcançar a porta sem acordá-los.
depois de algumas horas, já perto do final da manhã, caminhou até a clínica veterinária. quando entrou, a doutora soomi sorriu com carinho.
— feliz aniversário, haerin. veio cedo.
— como você sabe? — haerin murmurou, corando. soomi balançou a cabeça apenas apontou a sala. lá dentro, sushi estava encolhidinha, mas desperta. ao ouvir a voz da dona, levantou um pouco a cabeça, como se estivesse chamando por ela.
na hora do almoço havia combinado de se encontrar com o resto da turma do scooby doo. o vento gelado bateu no rosto dela assim que saiu da clínica, fazendo seus olhos arderem. olhando o chat cheio de mensagens dos amigos, haerin sorriu fraco e respondeu que estava a caminho.
com eles, haerin não conseguia evitar sorrir. e enquanto comia, percebeu que o corpo estava, aos poucos, mais descansado.
por algumas horas, ela conseguiu respirar.
o medo não sumiu.
a dívida não evaporou.
a sushi ainda precisava de cuidados que ela mal podia pagar.
quando o dia já estava avançando e o sol começava a ficar mais suave, haerin finalmente teve um momento sozinha. tinha passado a manhã e boa parte da tarde se distraindo, mas queria conferir seu celular e notificações. quando acendeu a tela, viu o contrário: uma chuva de mensagens entrando de todos os lugares possíveis.
primeiro, dos seus amigos. depois o pessoal do ateliê. colegas de curso. gente que mal falava com ela, mas tinha lembrado do aniversário.
haerin riu sem querer. um riso curto, surpreso, daqueles que escapam antes de você decidir se quer rir mesmo. ela não sabia que tanta gente ia lembrar. não tinha esperado tanto. não achava que ocupava espaço suficiente na vida dos outros pra ser lembrada assim. mas ali estava. várias pessoas mandando um carinho para ela.
e antes mesmo de perceber, os olhos dela arderam. não era tristeza, era só a sensação de ser vista. ela passou o polegar rápido sob o olho, fingindo que era só o vento. respirou fundo. e apertou o celular contra a palma da mão.
e foi bem no meio desse sentimento que o celular vibrou com uma chamada. o nome na tela?
halmeoni 💛
haerin atendeu rápido, ajeitando a voz.
a voz da avó surgiu, com doçura e preocupação.
— haerin-ah… não ia atender a sua avó no aniversário?
o sorriso de haerin apareceu antes mesmo da resposta.
— eu ia… só… o dia foi meio cheio.
— cheio do quê? cheio de coisa boa ou cheio dessas coisas que deixam a minha neta com essa voz de quem não dorme há uma semana?
— eu só tô com saudade, não se preocupa.
a avó riu baixinho e preferiu não comentar, conhecia a teimosia da neta.
— eu senti também. — um som leve, quase um carinho. — você está bem? está comendo direito? está dormindo?
haerin fechou os olhos. — tô tentando, halmeoni. essa semana foi difícil.
— eu sei, nabi. eu sei. e… haerin-ah, tem outra coisa.
a avó hesitou, e naquela pausa haerin já sabia que não gostaria da resposta.
— seu pai… — outra pausa, mais pesada. — ele mandou notícias essa semana.
o coração da haerin encolheu. a respiração ficou presa na garganta, mas ela não disse nada.
— não se preocupa, minha borboleta. — a avó continuou, com cuidado. — eu não respondi. não falei do seu aniversário. só… achei que você devia saber.
a voz saiu pequena, mas firme.
— feliz aniversário, nabi. eu te amo e quando você vier me visitar, faço seu bolo favorito. prometo..
quando desligou, haerin ficou parada por um momento no meio da calçada, abraçando o celular com as duas mãos. não sabia ainda como resolveria tudo: a sushi, o dinheiro, as preocupações, o fantasma de alguém que ela escolheu não ter na vida, mas depois daquele dia, por mais simples que tenha sido, haerin se sentiu segura e amada.