July 6, 2022

O TRIBUNAL SUPREMO

Situado na parte oriental da cidade da Babilônia, num suntuoso palácio, com visão privilegiada do Eufrates, rodeado por belos jardins, o Tribunal de Apelação estava reunido, naquela manhã, sob a mão de ferro do perverso juiz Adramalec.

Dentre os assuntos da pauta do dia, um dizia respeito ao pedido de soltura de um conhecido comerciante de vinhos, preso, injustamente, há meses, com a anuência vergonhosa dos membros da Corte, por ter se insurgido contra o novo imposto das mercadorias vindas do estrangeiro.

O juiz, conhecido por sua crueldade e luxúria desmedidas, mal ouvia, agora, as alegações finais do advogado de defesa, que argumentava, com serenidade, que seu cliente não cometera crime algum, expressando, somente, o seu completo desagrado contra aquela abusiva taxação.

Requeria, portanto, o causídico, com base nos autos do processo, a soltura imediata do acusado, em face, sobretudo, de sua saúde precária, aliada à idade avançada, solicitando, com voz convincente, ao magistrado, justa clemência para o réu.

Despejando um olhar vazio de compaixão sobre aquele infeliz, que se encontrava bastante abatido, a um canto, aguardando a sentença, o maldoso juiz, com o barco dos pensamentos navegando além do Tigre, deslizando, apressados, para os braços macios de Isthar, sua amante, fez um gesto de enfado, exigindo atenção.

Diante daquilo, o defensor emudeceu de vez, enquanto o plenário aguçava ainda mais os ouvidos, aguardando, pressuroso, o veredicto do togado-mor, sabedores, desde sempre, que aquela Corte jamais se preocupava em fazer justiça, cujas penas impostas a muitos condenados, se somadas, chegariam até o Dia do Juízo Final.

E, mais uma vez, o famigerado juiz rasgou a lei, impondo a sua vontade tirânica, não acatando quaisquer pedidos feitos a ele.

Cansado de esperar em vão pela liberdade, macerado pelo sofrimento, não demorou muito que o comerciante batesse à porta do céu.

Do alto da sua empáfia, Adramalec, por sua vez, à medida que o tempo corria, sem que ninguém ousasse contestar suas ações abjetas, perpetradas, inclusive, contra pessoas inocentes, exercia sua tirania absoluta no Supremo Tribunal.

Por séculos, silenciosos, os zigurates testemunharam os caminhos trilhados pelas estrelas, trazendo, até nós, o brilho inconfundível da civilização suméria.

No vão das coisas que jamais se perdem, as perversidades do juiz babilônico perpassaram as gerações, revelando que as trevas do mal podem encobrir, por vezes, o luzir do bem, sendo dissipadas, apenas, quando não nos calamos diante de injustiças, doando a própria vida, se preciso, para repormos o direito.

E, assim, deveria caminhar a humanidade!

AVELAR SANTOS
A/S CAMOCIM-CE

Este trabalho foi escrito por AVELAR SANTOS, a quem
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