A Filosofia Espírita
Qual a origem da Filosofia? Qual o motivo que despertou no homem o desejo de pensar filosoficamente? Há um impulso irreprimível de buscar a verdade que faz parte da natureza humana.
"Uma curiosidade inata nos impele à procura de saber o que ignoramos, como uma obrigação de se participar conscientemente de tudo que se passa ao nosso redor (...) O saber se nos afigura como o ponto culminante no processo da vida". (Prof. Manoel Pelicas São Marcos)
Todo ser humano é pensante e questionador por natureza, e sua realização consiste em atualizar as suas potências. A racionalidade faz parte da natureza humana, à maneira de semelhança e imagem, de Deus. Deus não fez o homem de barro, mas criou um ser pensante, portanto, filósofo.
Primeiro, foi o espanto do mundo e dos homens, a curiosidade insaciável, a capacidade de admirar e problematizar as coisas; depois, o despertar crítico. O ser humano queria uma explicação para o mundo, uma ordem para o caos. Essa busca da verdade tornou-o cada vez mais exigente e o homem sentiu uma necessidade crescente de entender e de explicar de maneira coerente, clara e precisa, o mundo e o universo. Essa busca de saber fez nascer a Filosofia.
Distinção entre Ciência e Filosofia
Em O Livro dos Espíritos, Kardec afirma que a ciência espírita contém duas partes: uma experimental, sobre as manifestações em geral, outra filosófica, sobre as manifestações inteligentes.
Poderíamos comparar, assim, o Espiritismo, por uma questão didática, com o Universo que tem duas faces: uma aparente, visível e iluminada, a outra invisível, oculta aos sentidos. A parte visível, apreendida pelos sentidos, é da alçada da ciência, que tem por objeto o fenômeno, ou seja, a realidade qual se aparenta para o homem. A outra parte, oculta e muito além dos sentidos, só pode ser compreendida pela razão, portanto, é da alçada da Filosofia. É assim que a Ciência, de um modo geral, emprega o método experimental, e a Filosofia emprega meios intelectivos, quais sejam a razão e a intuição. Essa parte invisível consiste no lado essencial, a natureza espiritual do universo – para a Filosofia Espírita e a Espiritualista.
Filosofia Espiritualista e Filosofia Espírita
Ao abrir O Livro dos Espíritos, este se apresenta sob a denominação de Filosofia Espiritualista. Como explicar essa relação da Filosofia Espírita com a Filosofia Espiritualista?
Um pensamento, se considerado isoladamente, permanece sempre arbitrário e individual; ele encontra sua justificação e seu sentido em um contexto; se este contexto estiver ligado a um conjunto maior, tudo o que é dito assume um sentido rigoroso, objetivo e universal. Efetivamente, a Filosofia Espírita faz parte, principalmente, da corrente espiritualista, como sendo o sistema mais genérico a que pertence, sistema este considerado por sua universalidade pela Filosofia Tradicional, e que, portanto, constitui a generalidade a que pertence a Filosofia Espírita.
Por espiritualismo, entende-se a doutrina segundo a qual o real é de natureza essencialmente espiritual. O Espiritismo está inserido no gênero Espiritualismo, mas, como especificidade, afirma a imortalidade da alma, a teoria da reencarnação e a mediunidade.
Filosofia em Geral e Filosofia Espírita
A Filosofia, de um modo geral, busca a compreensão do universo, de Deus, da vida e do homem. Mas ela consiste, acima de tudo, em uma ciência conceitual e que busca as causas primeiras e princípios de todas as coisas. Sua realidade última é a sabedoria e a moral, consistindo, portanto, em um acesso à interioridade. Embora considerada ciência teórica, ela é também prática, pois visa à prática da virtude e à transformação moral do homem, assim como à explicação para os problemas existenciais.
A Filosofia Espírita, assim como a Filosofia em geral, tem como objeto de conhecimento o mundo inteligível, isto é, o mundo não sensível e concebido apenas pelo intelecto. Seu objeto de conhecimento específico, no entanto, é o Espírito (ser extracorpóreo da criação) e o espírito (essência universal). Efetivamente, ela estuda o real fora do tempo e do espaço, uma vez que a substância espiritual não ocupa espaço e nem se dá no tempo mensurável. Para tanto, a Filosofia, notadamente em seu aspecto metafísico, emprega o método racional, pois sua força está na lógica de seus fundamentos.
Principais Ramos da Filosofia
ONTOLOGIA é a ciência do ser enquanto ser. Para a Filosofia Espírita, o ser metafísico é o princípio espiritual, visto que sempre foi e nunca deixará de ser.
GNOSIOLOGIA ou TEORIA DO CONHECIMENTO é a parte da Filosofia definida como a investigação acerca das condições e dos processos do conhecimento verdadeiro. Para tanto, ela se ocupa da relação entre o sujeito cognoscente e o objeto cognoscível no processo de conhecimento.
Outras Subdivisões da Filosofia
COSMOLOGIA é a ciência que estuda a origem e constituição do universo, assim como suas transformações no devir.
METAFÍSICA é a ciência das causas e princípios primeiros. Estuda, por exemplo, a essência do Universo, a existência de Deus e da alma.
ÉTICA é a parte da Filosofia que se ocupa com a reflexão a respeito das noções e princípios que regulam a vida moral.
Estrutura Lógica de “O Livro dos Espíritos”
Segundo Herculano Pires, os títulos contido em “O Livro dos Espíritos” pertencem às seguintes partes da Filosofia:
- AS CAUSAS PRIMÁRIAS = Metafísica
- A CRIAÇÃO = Cosmologia
- A ORIGEM E A NATUREZA DOS ESPÍRITOS = Ontologia
- AS LEIS MORAIS = Ética Espírita
- AS PENAS E GOZOS FUTUROS = Teologia
Percebe-se, assim, todo um encadeamento lógico ou dedutivo na abordagem dos capítulos, o que é inerente à Filosofia; da mesma forma, um curso de filosofia deve ser sistematizado com coerência, pois conceitos soltos e fragmentados caracterizam-se por imprecisão e superficialidade, e não possuem, portanto, legitimidade científica. Importa considerar que a Filosofia é uma ciência rigorosa e que requer, acima de tudo, o ideal de precisão.
Herculano Pires (1914 - 1979) foi um jornalista, filósofo, educador, escritor e tradutor brasileiro. Destacou-se como um dos mais ativos divulgadores do Espiritismo no país. Traduziu os escritos de Allan Kardec e escreveu tanto estudos filosóficos, quanto obras literárias inspiradas na Doutrina Espírita, algumas em parceria com Chico Xavier.