March 18, 2021

The New York Times: Marie Mongan, que desenvolveu a hipnoterapia para parto, morreu aos 86 anos.

Suas técnicas de parto natural foram usadas por Kate Middleton, Jessica Alba e muitas outras mulheres ao redor do mundo em busca de uma experiência mais gentil e sem medicações.

Foto: Marie Mongan em 2015. Profissionais médicos em 46 países foram certificados em suas técnicas de hipnotismo. Credito: Grigoriy Yaroshenko.

Por Christina Caron

Publicado originalmente em 16 de março de 2021. Atualizado em 17 de março de 2021.


Tradução livre (adaptada) da matéria original publicada no The New York Times: "Marie Mongan, 86, Who Developed Hypnotherapy for Childbirth, Dies". Acesse aqui!


Quando Marie Mongan estava grávida de seu terceiro filho na década de 1950, ela fez uma exigência incomum. Ela disse ao médico que, quando chegasse a hora de dar à luz, ela não queria anestesia e se ele não concordasse com seus termos, ela encontraria alguém que o fizesse.

Ela recusou a anestesia durante as duas primeiras gestações também, mas nas duas oportunidades as enfermeiras não lhe deram ouvidos. Seguraram seus pulsos com tiras de couro e forçaram um cone de éter em seu rosto.

Depois que seu segundo filho nasceu "da mesma maneira triste", disse Mongan, ela jurou: "Nunca mais!"

A Sra. Mongan passou anos se preparando para um parto sem medicações. Durante sua primeira gravidez, ela devorou ​​as obras de Grantly Dick-Read, um obstetra britânico que popularizou a frase “parto natural” e defendeu o relaxamento para diminuir a dor. Depois de estudar seu livro "Childbirth Without Fear" (Parto sem Medo), ela aprendeu como entrar em um estado de relaxamento profundo.

Ela finalmente experimentou um trabalho de parto não medicado em 1959, na sua terceira gestação, da sua filha Maura; disse ela, “foi o nascimento mais bonito que eu poderia ter imaginado”. Ela deu à luz na sua quarta gestação da mesma maneira, “e foi tão espetacular”, disse ela.

A Sra. Mongan que foi uma educadora de longa data onde atuou no Estado Americano de New Hampshire, também se tornou uma hipnoterapeuta certificada. Mas só em 1989, quando Maura, sua filha, engravidou, foi que Mongan começou a dar aulas de hipnotismo, uma série de técnicas que usam hipnose, afirmações positivas, visualizações e meditação para aliviar a dor do parto natural.

Acho que essa foi a sua porta de entrada”, disse sua filha, Maura Geddes, em uma entrevista por telefone.

O "Método Mongan", ensinado pela primeira vez à Maura Geddes e alguns outros casais, começou a se espalhar boca a boca no início da década em 1990. Embora a hipnose á tenha sido usada na obstetrícia por mais de um século, ela não foi amplamente estudada como uma ferramenta para o parto. A Sra. Mongan logo começou a receber solicitações para treinar não apenas pais, mas também enfermeiras, doulas [1] e hipnoterapeutas. Um livro subsequente, a imprensa nacional e eventualmente o próprio instituto de Mongan ajudaram o hipnotismo a ganhar popularidade em todo o mundo, seus métodos foram usados ​​e endossados ​​por celebridades como Kate Middleton e Jessica Alba.

A Sra. Mongan tinha 86 anos quando morreu em 17 de junho de 2019, na casa de sua filha, na cidade de Bow - NH. Sua morte não foi amplamente divulgada na época, mas ganhou maior atenção quando foi relatada pelo "The Washington Post " no mês passado (fevereiro de 2021). Maura Geddes disse que a causa foram complicações da síndrome de Sjogren [2], uma doença autoimune.

Enquanto crescia, Mongan sempre ouvia sobre seu próprio nascimento por meio de sua mãe, que descrevia o trabalho de parto e o parto em si como tão traumáticos que ela acreditava ter causado danos permanentes em seu corpo.

“Senti uma enorme culpa durante meus anos de crescimento”, escreveu Mongan na quarta edição de seu livro, “HypnoBirthing: The Mongan Method”, publicado originalmente em 1992.

Quando Maura Geddes engravidou, Mongan, que já havia se certificado em hipnoterapia, guiou sua filha por uma experiência de parto tranquila, completou com o que ela chamou de “música de relaxamento do arco-íris” (rainbow relaxation music).

As enfermeiras entravam e diziam: "Não consigo acreditar como ela está calma”, lembra Geddes. Ela teve um filho, Kyle.

As mães que são guiadas pela hipnose estão "respirando seus bebês até culminar em um relaxamento profundo", escreveu Mongan, em contraste com os ritmos de respiração ofegantes, característicos das primeiras iterações do método Lamaze [3], que se tornou popular na década de 1960.

"A hipnose não coloca as mulheres em transe nem as faz adormecer", disse Mongan ao The Washington Times em 2000. "É semelhante ao devaneio ou concentração que ocorre quando você está absorta em um livro ou olhando para o fogo - você perde acompanhar o que está acontecendo ao seu redor”, disse ela. “Você pode estar totalmente relaxado, mas totalmente no controle”.

Ela acrescentou: “No parto, quando a mente aceita a crença de que, sem complicações, o parto prossegue naturalmente, não existe dor e nenhuma dor é experimentada”.

Em 1999, cerca de uma década após o nascimento de Kyle, neto de Mongan, o programa “Dateline” da NBC News publicou um segmento sobre um Obstetra e Ginecologista na Flórida que usava hipnose em seus pacientes, apresentando-a aos telespectadores como uma "técnica notável" que alguns dizem "pode ​​fazer o trabalho fácil e até divertido!” A Sra. Mongan não foi mencionada nesta transmissão, mas ela era mencionada em um artigo online que continha um link para o seu site.

Depois ela disse que recebeu quase 5.000 ligações e e-mails. O Boston Globe (jornal americano) relatou que seu livro “esgotou” em nove semanas.

Capa do livro HypnoBirthing: The Mongan Method, Marie Mongan. Fonte: The New York Times.

Em seu livro, “HypnoBirthing: The Mongan Method”, a Sra. Mongan disse que o nascimento de seu terceiro filho usando suas técnicas de relaxamento foi “o nascimento mais bonito que eu poderia ter imaginado”.

Marie Mongan, nome de batismo, Marie Madeline Flanagan, que era chamada de Mickey, nasceu em San Diego em 01 de fevereiro de 1933, filha de Marie e Patrick Flanagan. Sua mãe era costureira e seu pai um suboficial da Marinha que se tornou chefe de uma fábrica de tecidos depois que a família se mudou para a cidade de Franklin, NH.

"Mickey" se casou com seu namorado do colégio, Gerald Bilodeau, em 1954 e se formou no que hoje é a Plymouth State University, em New Hampshire. Ela então ensinou inglês na escola que frequentou.

O casal se divorciou em 1966. Em 1970 ela se casou com Eugene Mongan, que morreu em 2013. Além de Maura Geddes, Marie Mongan deixou seus três outros filhos, Wayne Flanagan, Brian Kelly e Shawn Mongan; três enteados, Michelle Shoemaker, Steve Mongan e Nancy Kelley; 17 netos; e quatro bisnetos.

Antes de seu nome ser associado ao hipnotismo, a Sra. Mongan fora reitora do Pierce College for Women em Concord - NH, nomeada em 1965, que fechou em 1972. Seis anos depois, ela recebeu um diploma de mestre em educação pelo estado de Plymouth. Em Concord, ela abriu a "Thomas Secretarial School", que não existe mais.

Suas aulas de hipnotismo a levaram a criar o "HypnoBirthing Institute", agora “HypnoBirthing International”, com sede em na cidade de Pembroke, NH - EUA, do qual Maura Geddes é a executiva-chefe. A organização treinou e certificou médicos, doulas, parteiras e leigos para se tornarem educadores do HypnoBirthing em 46 países, disse Vivian Keeler, uma quiropata e doula atualmente presidente da HypnoBirthing International.

Apesar da popularidade do hypnobirthing, em 2016 a "Cochrane Collaboration", uma conceituda rede de pesquisadores independentes, revisou nove estudos clínicos envolvendo cerca de 3.000 mulheres e avaliou que não havia evidências suficientes para determinar com certeza se a hipnose ajuda as mulheres a sentir menos dor durante o trabalho de parto, ou se, as ajuda a lidar melhor com o trabalho de parto.

Mas um estudo clínico publicado em 2015 no BJOG, um jornal revisado por profissionais a nível internacional de obstetrícia e ginecologia, mostrou que a hipnoterapia pode ajudar as mulheres a sentirem menos medo e ansiedade durante o trabalho de parto.

As participantes “começaram como céticas, mas acabaram sendo muito positivas sobre a técnica, assim como seus parceiros”, Dr. Soo Downe, um dos autores do estudo e professor em estudos de obstetrícia na "University of Central Lancashire", na Inglaterra, disse ao The New York Times em 2019.

O neto de Mongan, Kyle Geddes, agora com 31 anos, lembra-se de ter sido hipnotizado pela avó quando era mais jovem e precisava de ajuda para adormecer. Ele e sua esposa estão esperando seu primeiro filho e têm frequentado aulas de hipnotismo.

O treinamento de hipnose até ajudou Mongan quando ela adoeceu várias vezes em seus últimos anos e a certa altura precisou de uma "cirurgia cardíaca de peito aberto [4]", disse Maura Geddes.

Nos últimos meses, mesmo depois de perder a visão, ela continuou a trabalhar em um novo livro sobre hipnotismo, ditando seus pensamentos à sua secretária.

Ela era muito boa em colocar sua mente em algo e ver o que acontecia”, disse Keeler, presidente da HypnoBirthing International. “Uma coisa que eu disse a ela foi: Você perdeu sua visão, mas nunca perdeu sua visão".


Alain Delaquérière contribuiu com a pesquisa.

Christina Caron é uma repórter parental. Antes de ingressar no The Times em 2014, ela passou uma década editando e escrevendo para notícias de transmissão e também trabalhou como coordenadora de pesquisa clínica no Dana-Farber Cancer Institute. @cdcaron


Nota:

  • [1] Doula: Profissional que tem como função acompanhar a gestante durante o período de gravidez, parto e período pós-parto, além de apoiar, encorajar, oferecer conforto e suporte emocional nestes momentos.
  • [2] Síndrome de Sjogren: Doença autoimune que se caracteriza principalmente pela manifestação de secura ocular e na boca associadas à presença de auto-anticorpos ou sinais de inflamação glandular.
  • [3] Método Lamaze: Método desenvolvido pelo obstetra francês Fernand Lamaze (1891-1957) como uma alternativa à intervenção médica durante o parto. O objetivo do Método de Lamaze é manter a mãe relaxada e focalizada na respiração.
  • [4] Cirurgia cardíaca de "peito aberto": Cirurgia típica para reparar ou substituir uma válvula cardíaca, o cirurgião faz uma grande incisão principal no meio do peito e esterno para acessar o coração.

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