November 8, 2021

creep

— nosso melhor dançarino solo masculino!!

kiki foi recebido desse jeito em casa, com a mãe gritando de felicidade com os braços abertos, e o idol não hesitou por um segundo de correr aos braços da mulher para ser envolvido com um abraço de urso com direito a vários beijinhos espalhados pelo rosto todo e que provavelmente deixaria maricas do batom vermelho que ela usava.

seu pai e eu vimos a premiação pela TV e estamos muito orgulhosos. kiki sabia que aquela frase tinha apenas um intuito: avisá-lo de que youngdo - o homem que o criou pensando que era seu pai - voltou de viagem e estava em casa, para que minki fosse mais cuidadoso em suas palavras. suas performances foram maravilhosas, filho. sempre impecável, o orgulho da mamãe.

mesmo que disfarçadas de um aviso, kiki ainda sabia que as palavras da mulher eram verdadeiras, então ele soltou uma risada no meio dos beijos, realmente feliz com a conquista, com a comemoração toda.

— obrigado! você ouviu a música nova? o que achou? — os olhos estavam pequenininhos de tão largo que minki sorria, mas ele não chegou a ouvir uma resposta, já que outra figura chegou na sala.

youngdo era alguns anos mais velho que sua mãe, mas não aparentava; estava em forma e bem cuidado como se fosse quase dez anos mais novo do que sua idade verdadeira. o homem carregava um sorriso tão grande e orgulhoso quanto o da esposa e trazia consigo um mini bolo com uma velinha.

papai está orgulhoso de você. parabéns, kiki. você merece isso e muito mais. na próxima, vai ganhar muitos outros prêmios!

e com uma fala tão inocente, youngdo quebrou o mundo cor de rosa que minki estava vivendo e foi como se tivesse levado um soco no estômago. o semblante se fechou imediatamente e kiki teve vontade de chorar ali mesmo, porém se segurou. colocou de volta um sorriso, mas sabia que não estava mais tão natural quanto o de antes.

quase que roboticamente, se aproximou do mais velho e assoprou a vela do bolo, estendendo os braços para receber o abraço apertado do homem, também.

— obrigado, pai. é muito importante pra mim. — curvou-se levemente para demonstrar respeito, logo se afastando. — eu vou... colocar o prêmio no meu quarto, sim? já volto.

mal deu tempo de qualquer um deles dizer alguma coisa, que já estava subindo as escadas e se jogando na cama para deixar as lágrimas correrem.

a visão do troféu embaçado pelo choro só fazia com que kiki se sentisse ainda pior. queria jogar aquilo na parede até estar em pedaços. não o merecia de verdade, claro que não! esse prêmio nunca foi seu e isso agora era óbvio. como foi que não pensou nisso antes?

minki, querido, o que foi? normalmente, a mãe daria o mínimo de privacidade para kiki e bateria na porta antes de entrar, porém ignorou as boas maneiras dessa vez ao escutar o rapaz chorando e o puxar para um abraço.

— ele voltou pra ver a premiação e me falar parabéns?

minki não precisou dizer mais nada para que mikyung entendesse tudo. a mãe o apertou mais um pouco e começou a mexer nos fios descoloridos.

— disse que ficou sabendo das nomeações e que queria estar aqui quando você voltasse com os prêmios.

— é óbvio que ele sabia que eu ia voltar com um prêmio. — kiki revirou os olhos e riu pelo nariz, sem humor algum. — será que eu nunca vou receber nada pelo meu próprio mérito? ele vai continuar comprando tudo pra mim? qual é o ponto de ter um troféu olhando pra mim quando eu nunca mereci ele?

— minki, calma. — mikyung segurou o rosto de kiki, limpando suas lágrimas, e o forçando a olhá-la nos olhos. — nada garante que ele comprou esse prêmio. olha, o youngdo fez muita coisa e ajudou a dar luz pro talento que você sempre teve. eu sei que isso pesa em você, mas veja como uma oportunidade, um caminho mais curto. você teria entrado no programa ou em qualquer empresa pelos métodos normais e pelo seu próprio mérito se quisesse, porque você é ótimo no que faz.

por um tempo, kiki olhava para toda sua carreira como uma oportunidade, mesmo. começou a trabalhar em coisas que gostava - modelar e cantar - quando ainda era pequeno, porque o "pai" lhe deu essa oportunidade. entrou num survival e debutou num grupo famoso porque o "pai" lhe seu essa oportunidade. então porque ele continuava se sentindo como se não merecesse nada daquilo?

voltou a encarar o troféu e limpou o rosto, fungando. para alguém que falava tanto, minki estava especialmente quieto.

— foi uma oportunidade e tanto. mas eu não devia estar aqui. esse prêmio era provavelmente do romeo. youngdo só não comprou o de melhor solo masculino porque ia dar muito na cara não é? — a voz saia embargada mesmo depois do tempo de silêncio para se recuperar.

— kiki, filho, não fala assim. você não sabe se ele comprou esse prêmio. você é um dançarino incrível e esforçado, e com certeza isso foi reconhecido.

— será? então porque ele voltou de viagem mais cedo tão certo de que eu ia levar um prêmio?

— porque ele é seu pai. um bom pai. — mikyung falou, deixando kiki confuso por alguns segundos. — ele pode não ser seu pai biológico, kiki, mas ele pensa que é, e te criou com todo amor e carinho que podia dentro da agenda lotada dele. deixar seus compromissos para te parabenizar talvez tenha sido apenas confiança no seu talento e a vontade de estar aqui por você. do mesmo jeito que eu tinha certeza que você ganharia uma das categorias que foi indicado porque eu sei como você é bom. ele só estava sendo um bom pai.

kiki ficou sério e quieto mais uma vez, absorvendo a ideia toda. muitas vezes, esquecia que youngdo não tinha noção de que não era mesmo pai. esquecia que era visto por ele como um filho e que ele faria tudo por esse filho. desde que mikyung lhe contou toda a verdade, minki passou a ver youngdo diferente, como se kiki fosse apenas um brinquedinho para o ego do mais velho, mas nunca parou pra pensar que youngdo não tinha essa mesma visão e que tudo que fazia, era pensando no bem de minki.

o solista voltou a se deitar na cama, encarando o teto e respirando fundo para não voltar a chorar. quando foi que ficou tão frio ao ponto de mal conseguir chamar youngdo de pai, mesmo tendo sido criado por ele, mesmo que o kang não fosse o culpado da história? não era a falta dos laços de sangue que faria de youngdo menos seu pai, ainda que ele não fosse tão presente quanto kiki gostaria.

— você tem razão. — disse por fim. — mas mãe... e quanto ao meu pai biológico, ele está orgulhoso de mim?

a pergunta pegou mikyung de surpresa e a mulher demorou um tanto para responder, atônita.

— eu não teria como saber... eu te contei que nós terminamos antes de você nascer.

— e ficou por isso mesmo? ele sabia que você estava grávida dele e nunca me procurou? nunca quis saber de mim?

o silêncio dessa vez foi um pouco mais pesado, um pouco mais culpado e kiki sentia que as coisas não poderiam sair bem a partir dali. entretanto, insistiu mesmo assim:

— ele não sabia de mim?

— ele sabia. — a mulher foi rápida em responder.

— então ele me procurou e você que não deixou ele me ver, não é?

silencio novamente. silencio esse que minki quebrou com uma risada alta e irônica.

— wow. eu vou lavar o rosto, mãe. me espera lá embaixo. eu não sei se eu quero conversar com você agora.